Os dois períodos de greve dos trabalhadores do grupo SATA, continuam sem uma explicação plausível dos sindicatos aderentes, da administração e da tutela governamental.
Sabendo-se que os efeitos das paralizações tiveram consequências graves, sobretudo na indústria hoteleira da Ilha de São Miguel, esperava-se que as entidades envolvidas no conflito se entendessem rapidamente, para que a fragilidade da nossa economia não vivesse em permanente espetativa de poder ser uma vez mais afetada na época alta.
É certo que as partes já se sentaram à mesa, mas desconhece-se o que move os sindicatos nas suas inconfessáveis motivações.
Afirmei há dias, numa rede social, que temia que o conflito escondesse interesses mais poderosos de outros operadores aéreos e que os trabalhadores estivessem a ser usados num processo que poderia levar ao encerramento de empresas e ao despedimento de trabalhadores.
Hoje, parece-me mais correta esta leitura.
A TAP está em vias de privatização, mas os destinos e rotas operadas pela SATA Internacional, nomeadamente entre os Açores e Lisboa, continuam a ser um serviço apetecível mais ainda porque é subsidiado pelo Estado.
No último concurso público, a transportadora açoriana levou a melhor sobre a concorrente TAP, certamente por operar os serviços de “handling” nos aeroportos açorianos. Todavia se a situação se alterar, quem assegurará que nos quatro aeroportos, entretanto privatizados, não irá operar outra empresa? Será que os trabalhadores da SATA pensaram que esta situação poderá afetar postos de trabalho nos aeroportos de São Miguel, S.ta Maria, Faial e Flores, já que só os restantes são geridos pela SATA-Aeroportos?
Não auguro nada de bom para o futuro do grupo SATA.
A expansão do tráfego nacional e internacional da empresa açoriana, depara-se, agora, com a entrada de novos operadores de transporte aéreo mais poderosos e agressivos. Os seus objetivos nada tem a ver com os de uma empresa pública, como a TAP ou a SATA. Os privados preocupam-se, sobretudo, em conquistar e dominar o mercado, para imporem as suas regras e tarifários.
A privatização da TAP vai alterar, completamente, o mercado do transporte aéreo em Portugal. E se é verdade que o velho ditado chinês aconselha: ”se não podes com o teu inimigo, junta-te a ele”, o certo é que, dada a dimensão da SATA-Internacional, mais cedo ou mais tarde, ela será “engolida”, sem apelo nem agravo, e ficaremos entregues a operadores externos.
De resto, não é inocente que, passados tantos meses, o Governo de Lisboa ainda não tenha dado qualquer resposta à proposta tarifária apresentada pelo Governo dos Açores. É minha convicção que, também neste setor, o orçamento do Estado irá livrar-se da comparticipação das tarifas de residentes, endossando esse ónus aos orçamentos regionais.
A história política recente ensina-nos que, desde os governos de Cavaco Silva, as autonomias viveram grandes dificuldades e cortes financeiros da parte do Estado. Ressalvando os governos de Guterres e de Sócrates, todos os outros, eivados dum doentio pendor centralista, pretenderam impôr normas políticas e finançeiras, sem atender aos preceitos que consagraram na Lei Fundamental “o direito à livre administração dos Açores pelos açorianos”.
É neste complexo “puzzle” político, social e financeiro, que o Governo dos Açores tem de gerir as suas competências com o executivo de Lisboa.
O conflito na SATA constitui um sinal de como altos interesses políticos e empresariais se podem conjugar para afetar, gravemente, não só aquela empresa mas também a nossa frágil economia.
Neste ambiente nubloso, esperamos que governantes e agentes políticos regionais coincidam no propósito de defender, sobretudo, os interesses dos açorianos, em detrimento de conveniências de ocasião e de motivações conjunturais.
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